O poder transformador da Biodanza, um filme escrito e realizado por Martim David Gomes
The transforming power of Biodanza, a film written and directed by Martim David Gomes
SOBRE/ABOUT BIODANZA
A Biodanza nasceu no Chile, pela mão de Rolando Toro Araneda, há cerca de 50 anos.
É um sistema de integração e de desenvolvimento de potenciais humanos, mediante a dança e a música, acessível a qualquer pessoa, de qualquer idade.
Integração significa coerência e unidade entre as diferentes funções orgânicas e psíquicas. (O homem actual está dissociado a nível motor, emocional e orgânico. Sente uma coisa, pensa outra e actua de forma diferente.)
O desenvolvimento de potenciais humanos significa simplesmente a expressão genética das suas imensas capacidades afectivas e intelectuais.
“A Biodanza é uma poética de encontro humano, que permite a expressão da identidade e o prazer de viver”.
Os exercícios de Biodanza estão organizados a partir de um Modelo Teórico baseado nas Ciências da Vida: a Biologia, a Antropologia, a Psicologia e a Sociologia.
Não se trata apenas uma forma saudável de integração e saúde. A sua acção constitui uma forma de ecologia humana baseada numa percepção da vida como experiência suprema.
A Biodanza possibilita um verdadeiro renascimento existencial. Os alunos fortalecem a confiança em si mesmos, melhoram as suas formas de comunicação afectiva e resgatam o prazer de viver.
A Biodanza trabalha a parte saudável das pessoas e fundamentalmente o amor como fonte de vida.
A Biodanza está centrada na identidade e não na personalidade e utiliza indistintamente linguagem científica e poética.
Biodanza was born in Chile, created by Rolando Toro Araneda over 50 years ago.
It is a system of integration and development of the human potential through dance and music, accessible to anyone, of any age.
Integration means coherence and unity between different organic and psychic functions. (Modern man is dissociated from his motor, emotional and organic functions. He feels one thing, thinks another and acts in a different way).
The development of human potential simply means the genetic expression of our immense emotional and intellectual capacities.
"Biodanza is the poetry of human encounter, which allows the expression of identity and the joy of living".
The Biodanza exercises are organized from a theoretical model based on the Life Sciences: Biology, Anthropology, Psychology and Sociology.
Not only is it a healthy path towards integration and wellbeing. Its action constitutes a form of human ecology based on the perception of life as a supreme experience.
Biodanza enables a true existential rebirth. Students strengthen self-confidence, improve their communication and affection skills and redeem the joy of living.
Biodanza works the healthy side of people and fundamentally love as the source of life.
Biodanza is centered on identity and not on personality and uses interchangeably scientific and poetic language.
O LIVRO/THE BOOK
Um projecto de Amor. Um livro sobre Biodanza. O primeiro em muitos anos. Em português e inglês.
A project of Love. A book about Biodanza. The first in many years. In English and Portuguese.
Saiba mais sobre o livro aqui. You can find out more about it here.
Excertos dos textos escritos por Elsa David para o livro:
A Biodanza na minha vida.
Sempre tive duas paixões na vida: desenhar e dançar. Ao longo dos anos e dos estudos desenvolvi as duas mas a arquitectura e as artes plásticas tomaram a dianteira. Sempre me exprimi através do traço, das manchas, das cores, dos volumes, e sentia-me feliz com a expressão da minha criatividade nos meus projectos. Em paralelo a dança nunca me deixou (pratiquei-a desde criança) porque deflagrava em mim vivências que eu não atingia de outra forma. Pulsando entre essa expressão plástica do traço e essa expressão emocional do gesto decorreram 40 anos da minha vida. Conheci a Biodanza numa aula aberta em Sintra com o meu facilitador do coração: Nuno Pinto. Cheguei lá sem conhecer nada nem ninguém, seguindo um impulso interno. Pensando que a Biodanza seria mais um outro tipo de dança, como as muitas formas que tinha experimentado ao longo da vida. Assim, a Biodanza entrou em mim pela dança e pelo meu prazer de dançar. Isso foi aquilo que me levou a procura-la.
Percebi rapidamente que a Biodanza ecoava fundo no mais profundo da minha alma. Sabendo eu o quanto as experiências de dança podem ser deflagradoras de vivências intensas, tudo parecia encaixar num caminho que eu teria de seguir até ao último dos meus dias.
Comecei a Escola de Biodanza ávida de conhecimento, afinal, haver uma base teórica transdisciplinar que sustentasse a experiência da Biodanza era algo imperdível.
Avançando no percurso da Escola fui-me comprometendo com o processo de vir a ser facilitadora um dia, algo impensável nos meus inícios, por me sentir tão realizada com a minha profissão anterior. Percebi aos poucos que acumular experiências só nos enriquece, e que, se nos auto-regularmos, podemos ir fazendo e desenvolvendo tudo aquilo que nos propomos, dentro deste universo abundante que nos rodeia, sem termos de desistir de nada, a não ser daquilo que nos tolhe e prende os sentidos e a percepção da realidade da vida.
Mas o grande salto evolutivo no processo que é a Biodanza (começamos por ser alunos de grupos regulares, depois fazemos workshops vivenciais e de aprofundamento, depois a escola de formação de facilitadores…) o grande salto “quântico” dá-se quando começamos a ser facilitadores.
Primeiro facilitadores em supervisão, depois facilitadores titulados e depois finalmente facilitadores didactas. Um caminho infinito de aprendizagem. Sempre mais, mais profundo, mais enriquecedor, mais satisfatório. Não avançamos sozinhos, não crescemos separados, tudo se consegue em grupo, quase sem darmos por isso. E um dia … a nossa vida não é mais a mesma! Por isso me foco sempre no potencial transformador da Biodanza.
Costumo dizer que, em mim, a Biodanza, virou-me a vida “de pernas para o ar”, ou talvez devesse dizer o contrário, porque a sinto agora mais harmoniosa e equilibrada do que antes.
Não posso deixar de mencionar na minha biografia de facilitadora as experiencias que fui tendo enquanto facilitadora de vários grupos e como elas me foram realmente transformando. Um crescimento a par e passo com todos aqueles que me rodeavam. Acompanhar um grupo regular acarreta essa responsabilidade de inspirar os outros a viver de forma não mais dissociada. Essa foi a minha aposta desde o início.
A minha primeira experiência – Maio/Junho 2008 – foi numa grande empresa – num estágio que duraria 6 semanas, e que deixaria a porta aberta para uma possível continuação, que acabou por nunca acontecer. A experiência foi válida porque desmontou a minha ilusão de trabalhar com workaholics em empresas. A minha segunda experiência – Maio 2008/Janeiro 2009 foi com um grupo de Acção Social na Academia Sénior da Cruz Vermelha da Parede. Um grupo de cerca de 25 alunos com idades entre os 60 e os 80 anos que se deixou contagiar pelo meu entusiasmo, abrindo-se à experiência de dançar a vida, de forma plena.
A minha terceira experiência, um Grupo Regular de Integração, teve início em meados de Outubro de 2008 reuniu alguns alunos que transitaram do grupo da Cruz Vermelha e muitos que surgiram espontaneamente, vindos pela mão de amigos ou tomando conhecimento através de alguma pouca divulgação que fiz. O grupo constituiu rapidamente uma “matriz grupal” com um núcleo de cerca de 20 elementos, entre os 27 e os 72 anos, sendo o número de senhoras e de homens muito aproximado. Alguns desses alunos ainda dançam comigo (alguns há mais de 5 anos) e hoje são facilitadores ou estão a terminar o curso para facilitadores. Esse foi o meu primeiro grupo aberto e lembro-me que cada semana celebrava a entrada de novos alunos com alegria e entusiasmo, mas também, ao longo dos anos, fui lidando com o meu desapego (uma grande aprendizagem para mim) quando eles, por diversos motivos, partiam.
Esse grupo constituído em Outubro de 2008 transitou para Grupo Regular de Aprofundamento em Janeiro de 2012, altura em que abri um segundo grupo de integração de início. Esse segundo grupo integrou já parcialmente o Grupo de Aprofundamento e abri um terceiro grupo de integração em Setembro de 2013. A vida não pára. A Biodanza vai tomando um lugar cada vez mais importante na minha vida.
Sinto cada aluno como o autor da sua própria vida, inspiro-o a isso mesmo.
A relação com os alunos.
Ser facilitador é como ser um jardineiro frente a uma semente que contem já todos os potenciais (conceito de Carl Rogers, muito interessante e muito diferente do conceito do professor que vai depositar a sua imensa sabedoria nos alunos ignorantes). Ser facilitadora devolve-me infinitamente mais do que alguma vez poderei dar aos meus alunos e aprendo com eles tanto mais do que alguma vez lhes poderei ensinar. O tal salto “quântico” de que falava antes é isso mesmo, a percepção plena de que evoluímos a par com os nossos alunos, crescemos com eles num processo mágico de simbiose plena. Acompanhando eu sou acompanhada, ensinando eu aprendo, pondo em práctica tudo aquilo que aprendi eu partilho com os outros e comigo e a transformação acontece. Mudei de companheiro, de profissão, de cidade, de casa, de prioridades. Sou muito melhor mulher e mãe, conheço-me muito melhor e sou muito mais tolerante comigo, aprendi a lidar com o mundo temperamental e revolto das emoções com carinho e um cuidado infinito, não sei mais dar conselhos mas ajudo a abrir os olhos e a “sacudir” aqueles que precisam de mudar de vida.
Ensinar assim é maravilhoso porque é um “aprender junto”. Como facilitadora apenas tenho que criar as condições ideais para que essa semente se desenvolva. Um jardineiro cuidadoso vai cuidar que não haja demasiado sol nem chuva, nem demasiado vento, nem que seja uma zona de passagem com um trânsito intenso. Um facilitador faz o mesmo, reúne os ecofactores positivos que vão criar o melhor entorno possível para que o aluno desenvolva todos os seus potenciais.
Sabemos que facilitar um processo de Biodanza é favorecer mudanças no estilo da vida do aluno. Mas nós próprios temos de fazer o nosso processo, isso é fundamental. E temos de nos manter sempre muito atentos.
Por outro lado conhecer os exercícios, as músicas e as consignas[1] não chega, temos também de saber os efeitos da sua aplicação, os efeitos na bioquímica do organismo, os efeitos na existência humana.
E por último é fundamental a capacidade de escuta afectiva, refrear a tendência a intervir e a interpretar. Ser um facilitador é muito diferente de ser um terapeuta. Mas, tal como um terapeuta, é fundamental ter empatia e ter uma boa capacidade de observação e ter um grande sentido de responsabilidade.
O aluno de Biodanza é convidado a adquirir capacidades motoras de forma a se exprimir mais e mais plenamente quando dança, quando a música o dança a ele. A diferença em relação a outras formas de dança é que não há coreografia, nem apresentação, nem espectáculo, não é uma dança para se ver, é sim para se sentir.
Tendo eu própria feito um caminho da dança para a Biodanza carrego na minha herança a vontade de inspirar os meus alunos a se disponibilizarem para dançar mais e mais. Ao longo dos meus anos como facilitadora o mais importante foi aquilo que testemunhei no processo evolutivo dos meus alunos. A transformação é lenta mas extremamente potente. Como disse Rolando Toro, ”as pessoas possuem nelas uma força extraordinária que só espera ser invocada. Uma força de reorganização, de renovação, de reparação e de cura. No entanto essa força não pode ser evocada estando nós isolados. É na interacção com o mundo, com o grupo que dispara essa « physis » - essa alquimia sagrada”.
Quem são os meus alunos.
Os meus alunos são todos diferentes: idade, género, estudos, profissão, back-ground social e económico, peso e altura! E, no entanto, são tão próximos que se transformam aos poucos numa família. Muitos aparecem-me perseguindo sonhos de encontrarem alguém especial, de terem mais amigos, vontade de passarem um bom bocado, de se divertirem ao fim do dia. Muitos nunca ouviram falar de Biodanza e caem de pára-quedas sem saber o que procuram nem o que querem encontrar. Alguns alunos chegam-me em estados graves e esses exigem uma atenção e um sentido de responsabilidade muito especial da minha parte. A estes alunos nunca podemos deixar que olhem a Biodanza como uma salvação para todos os males nem que deixem de ser acompanhados subitamente pelos terapeutas que os têm vindo a seguir.
Existem vários graus de “gravidade” no estado anímico e psíquico dos alunos.
Alguns são mais fáceis de resgatar. Às vezes só ajudando a levar luz à consciência do problema. Sempre responsabilizando-os pelos seus processos e pelo caminho a fazer. E colocando o enfoque na sua parte saudável. Aqui referiria apenas um por ser recorrente: pessoas que internalizaram sabotadores à sua própria felicidade.
Foram-se encouraçando na sua infância e juventude, respondendo a desqualificações diversas da parte de outros (em geral pessoas muito próximas), e aos poucos, elas próprias assumiram esse papel de se continuarem a sabotar por desqualificação permanente (não vou conseguir, nunca soube fazer, não tenho jeito, não sei, não sou bonito, não sou inteligente, não tenho capacidades, etc).
Tomarem consciência de que elas próprias agora se sabotam no seu processo de serem felizes é o primeiro passo para irem tomando um caminho diferente.
Vivemos num mundo onde ser infeliz passou a ser normal e até de certa forma bem visto.
As poucas vezes que estive com Rolando Toro Araneda (Junho 2008, em Itália, e Janeiro 2009, em Portugal), aquilo que mais me impressionou foi a forma como falava, com uma vivacidade, uma intensidade, uma vontade de mais vida que contagiava e acendia os fogos mais apagados. Ele dava plena permissão a sermos felizes. É celebrando a vida como ele nos ensinou que todas as semanas dançamos. E pensar que reunir um grupo para dançar todas as semanas pode trazer resultados tão surpreendentes em relativamente pouco tempo é absolutamente avassalador.
Para mim que embora sempre tenha gostado muito de relações humanas nunca me considerei uma terapeuta, foi um abrir de portas, responsabilidade, consciencia.
Ao início ficava muito assustada porque alguns dos meus alunos começaram a separar-se dos companheiros o que me dava um desconforto tremendo mesmo sabendo que eram relações tóxicas assim tinham vivido durante anos (e de repente com alguns meses de aulas abriam as portas de casa para largarem uma vida que já não lhes fazia sentido!). Muitos alunos deixaram os comprimidos para dormir sabendo eu o quanto isso são processos que têm de ser feitos com acompanhamento médico. Passei os primeiros tempos de facilitadora numa agitação interna de não saber se estava a lidar bem com tudo aquilo que acontecia paralelamente às aulas com os meus alunos. Parecia que efectivamente se tinham envolvido num acelerador de processo de transformação que não havia forma de voltarem atrás. Depois habituei-me a que assim fosse. Por muito que falasse num processo homeopático, de transformação gradual percebi que para muitos alunos aquilo era uma porta aberta para uma vida de verdade. Uma revolução, um terramoto, uma viragem de 180 graus. E felizmente tenho à minha volta muitas histórias com finais felizes.